Dia desses, enquanto me encontrava presa ao nosso mar de carros que se tornou paisagem constante da cidade que habitamos, ouvi uma canção que adoro - Coqueiro Verde - que me distraiu por completo do caos ao meu redor.
Não sei se pelo desejo de me desligar do som incessante da orquestra das buzinas, cantarolei a música, desta vez, muito atenta à letra, que às vezes nos passa despercebida, numa injustiça sem fim àqueles que as compõem.
Acho a música deliciosa e a letra nos traz um dos temas que mais inquietam homens e mulheres do nosso planeta: o desencontro amoroso. O interessante é perceber como o homem, na música, tenta resolver o dilema – esperar eternamente ou ser durão, desistindo, por orgulho, da amada. Talvez este ponto seja um dos que diferencia os homens das mulheres. A espera, em nosso caso, alonga-se por tempo maior, já que o desejo feminino costuma ser mais persistente no campo do amor. Às vezes até passa do ponto de renúncia e o cor de rosa acaba por se transformar em tom acinzentado pela submissão que muitas mulheres aceitam, infelizmente, em nome do tal amor.
Mas voltando à música... O que mais me surpreendeu foi pensar que Leila Diniz poderia ter mesmo dito que “homem tem que ser durão”... Será? Uma mulher tão à frente de seu tempo, que, nas palavras da antropóloga Mirian Goldenberg, “[...] fazia e dizia o que muitos tinham o desejo de fazer e dizer. Não à toa, ela é apontada como uma precursora do feminismo no Brasil, uma feminista intuitiva que influenciou, decisivamente, as novas gerações. Leila Diniz, ao afirmar publicamente seus comportamentos e idéias a respeito da liberdade sexual, ao recusar os modelos tradicionais de casamento e de família e ao contestar a lógica da dominação masculina, passou a personificar as radicais transformações da condição feminina (e também masculina) que ocorreram no Brasil no final da década de 60.”
Se ela disse ou não, tentarei descobrir o contexto. Mas, em minha opinião, perdem os homens que se fazem de durão para não ter que pensar na mulher que querem, de que modo querem e se vale a pena esperar por ela, ainda que tenham que lhe dizer do mal estar que sentem em estar nesta posição. Mas também perdem as mulheres que se dispõem a esperar eternamente, sem nenhum movimento para ir ao encontro do que querem, descobrindo, por sua vez, o que realmente querem. Nem sempre o prazer está só na relação de amor, ainda que esta acrescente muito em nossas vidas. Este amor é realmente muito bom, mas não pode ser só o que traz sentido à vida. Podemos descobrir momentos deliciosos paralelamente ao encontro amoroso, como ser pega de surpresa, no meio da tarde, por uma canção esquecida.
Confesso a vocês que, naquele carro, naquele instante, senti-me feliz por cantarolar com Erasmo enquanto esperava o sinal verde me permitir seguir meu caminho rumo à vida, que nos traz, entre tantas coisas, o amor!
Coqueiro Verde
Composição: Roberto Carlos / Erasmo Carlos
Em frente ao coqueiro verde
Esperei uma eternidade
Já fumei um cigarro e meio
E Narinha não veio
Como diz Leila Diniz
O homem tem que ser durão
Se ela não chegar agora
Não precisa chegar
Pois eu vou me embora
Vou ler o meu Pasquim
Se ela chega e não me vê
Sai correndo atrás de mim
Para quem quiser conferir a entrevista que a Leila Diniz deu ao Pasquim em novembro de 1969 e que causou sensação na época, vejam no endereço abaixo.
ResponderExcluirhttp://www.semcortes.com/?p=131
Juliana, você pegou mesmo a veia do cronista que tem o cotidiano como matéria prima. Você sabe como pegar,dissecar e desenvolver isto. Vá em frente. Parabéns. Augusto.
ResponderExcluirJuliana, passei para te dar um oi. Obrigada por publicar o link da entrevista. Ia fazer outra coisa agora, mas vou embora ler o Pasquim e ver o que diz Leila Diniz. Homem durão, acho, é aquele que não tem medo e fica, corre atrás, briga, faz música e o que mais for necessário, sabe? e ele também é durão se vai embora, porque não tem mais música para fazer naquela história. não sei. estou viajando. Obrigada de novo, pela visita, pelas palavras e pelo post. Eu fico feliz que a lembrança da canção tenha te inspirado. É por isso que escolho músicas todos os dias. Inté, um abraço para você. Vivi
ResponderExcluirMuito bom quando a gente recebe visita de quem gosta. O Augusto, nem preciso dizer, é o dono do boteco que mais frequento atualmente, já que fui eleita comentarista oficial de seu blog.
ResponderExcluirA Viviane Zandonadi tem um programa na CBN que adoro, o Turismo e Gastronomia, que vai ao ar de segunda à sexta, às 13:05hs. Ela abre o programa todos os dias com músicas que escolhe a dedo. E foi dela a lembrança do Coqueiro Verde, neste dia que descrevi acima.
Pra quem quiser conferir o trabalho dos dois, os blogs estão listados aqui, na página principal.
O blog da Viviane é o "Melhor do Brasil". Na página da CBN vocês também conseguem ouvir seu programa.
Vale a pena saber mais sobre a idéia dos dois sobre lugares bons para se divertir, na companhia de um bom prato ou petisco.
Agora, a coincidência do fim de semana.
No blog do Augusto vocês poderão ver a foto de nosso encontro neste último sábado, com a presença ilustre do Jaguar, que passou por BH para o I Salão de Humor, aberto na Casa do Baile. E não é que ele também está presente na entrevista com a Leila Diniz, na época do Pasquim?
Para as visitas, voltem sempre. Um prazer tê-los por aqui. Juliana.
Ju,
ResponderExcluirAaaddoorei! Como eu já tinha te falado, você tem o dom da escrita - "prima letra". E ainda canta! Ganham os amigos, ganham os pacientes, claro!
E eu, ganho por acompanhar você estando longe, nem tanto, mas longe. Longe do barulho desse tipo de caos, pois como bem sabe, o caos pode estar em nós. Mas, das buzinas, com certeza. Quando quiser se inspirar em local silencioso, a Alecrim te espera de portas abertas! Saudade de você, amiga, de nossos papos e nossas "sessões"!
beijos, com carinho
Para você ver como é a Internet: escrevendo sobre essa música encontrei sua crônica.
ResponderExcluirLi e simplesmente tive que te dizer que adorei.
Adoro essa música e esse tema: desencontro amoroso.
Mas eu penso outras coisas quando ouço a música.
Eu poderia começar a usar termos técnicos chatíssimos para dizer o que eu acho, mas prefiro ir no popular, bem ao estilo da música. Ele diz que esperou uma eternidade... Acho simplesmente que o cara não quer ser um banana, que ele quer uma mulher que o valorize, que lhe tenha respeito, enfim... Até porque mulher nenhuma quer um banana: se eu sei alguma coisa sobre as senhoritas é que, ao lado de um cara assim, vocês nem vêem ali um homem, vêem uma outra coisa... Aliás, homem também não quer mulher banana.
Mas, o mais importante: parabéns pelo texto!
Oi Alexandre,
ResponderExcluirobrigada por seus comentários.
Parodiando os Titãs: "a gente não quer só amor, a gente quer respeito e cumplicidade" e um tanto de coisas a mais que tornam a relação muito melhor de ser vivida a dois.
Você está certo.
Volte sempre, um abraço, Juliana.