quarta-feira, 31 de outubro de 2012

amor de posse


nada, amor, nada...adianta não você querer saber o que tenho, tenho nada, só quero poder me silenciar um pouco...às vezes é preciso...

....ele insistia em saber tudo sobre ela, o gosto, o pensamento, o dia, a noite, a madrugada de sono, se houve, ou se houve vigília foi por que, ou por quem, que na verdade era esse o medo que o acompanhava, o que poderia ocupar o pensamento daquela mulher que não ele...

conheceram-se há pouco mais de um ano, ela interessada em aprender novidades, ele entediado em ensinar e cansado dos mesmos alunos desatentos, sua presença curiosa logo lhe despertou atenção...quem seria a moça que não largava o olhar de tudo o que ele dizia?

em pouco tempo as aulas se prolongaram em conversas de corredor, fazendo depois o caminho conhecido que o amor toma quando está se iniciando, o passeio tímido pelos bares da cidade, o jantar apreensivo com jeito de firmar compromisso, o beijo desejado, o encontro dos corpos, as juras eternas, amém...

não tinham presente que os impedissem de nada e o amém se transformou rapidamente em cotidiano, cama dividida no apartamento dele porque os livros eram tantos que não podiam se mudar dali...no início uma festa, como sempre há festa no início do amor...ela feliz com as atenções dele, o carinho dele, a presença dele, mesmo às vezes achando que pareciam um pouco demais...mas vinha de um passado de descasos juvenis que pensava que a maturidade fazia homens diferentes dos que conhecera, então foi se deixando levar...feliz estava e assim pretendia continuar...

era essa a promessa de um futuro que ela desejava...nunca imaginou nada muito sério em idade de descobertas mas se entregou sem muitas dúvidas porque sempre foi de pensar que a vida não pede muito adiamento das coisas, senão ela passa rápido demais e não espera os planejamentos.

o problema foi quando começaram as perguntas...eram algumas que viraram outras, que viraram muitas e acabaram em tormento diário pra alguém que não pensava em nada mais a não ser passar o tempo ao lado de um amor tranqüilo...

respondia muito no início, respondia pouco com o passar dos dias, respondia nada quando entendeu que dono era o que ele queria ser dos dias livres que sempre foram dela...

o silêncio virou razão pra briga, a briga virou passagem pro medo, o medo virou sinal de que ela teria que sumir...

sumiu...sem deixar bilhete, sem deixar lembrança, sem deixar carinho espalhado pela casa porque este acabou com os gritos dele...

soube depois que não foi a primeira...mas que foi a única que teve a coragem de buscar estrada além daquele amor de posse...

(da Série: "O amor de cada um", n.18)