segunda-feira, 31 de maio de 2010

Amor de Infância

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Ela diz: “anda” Ele diz: “tenho medo”, ela diz: “de que”? Ele: “do que iremos ver”...e ela: “não tenha medo, bobo, estou aqui pra proteger você”, ele: “você sempre diz isso mas depois corre e me abandona” e ela: “mentira, eu corro pra você correr atrás, você é que não vem, e nunca entendo por que”...ele: “porque se eu correr vão dizer que sou medroso”. E ela: “e daí, você sempre tem medo mesmo”. E ele: “não fala assim, tô aprendendo ainda a ver o mundo”...ela então se vira pra ele e lhe estende a mão: “segura aqui e vem comigo, agora, sem ficar aí pensando muito se deve ou não vir”. E ele: “queria ter sua coragem, você devia ter nascido depois de mim”...ela lhe sorri carinhosamente, com o maior amor do coração. Já tinha se acostumado a lhe apresentar as coisas do mundo que inventaram no quintal da casa da avó...só os dois sabiam daqueles segredos. Mas ele cismava sempre, tinha que esperar pela sua voz, pela sua mão, pela sua vontade de descobrir novidades, que era tão grande que parecia que não ia caber naquele quintal.

Naquela noite ela foi lhe mostrar a lua nascendo, grande, linda, e ele, que nunca tinha visto nada igual, no início gritou de susto, achou que era um balão de neve subindo e que se derretesse ia cair tudo em cima deles....ela morreu de rir, “onde já se viu balão de neve? Se fosse de algodão doce ainda ia, mas neve, por aqui?” Ele disse que viu neve no livro de histórias da mãe, que tinha uns pontinhos brancos espalhados pelo chão e a mãe disse que era neve sim...ele acreditou, “porque a mãe não mente nunca pra gente”...ele apertou sua mão com força, de medo, de felicidade, de amor por ela por quem era encantado, por sua delicadeza e determinação, ao mesmo tempo, de ir lhe apresentando coisas que descobria primeiro...ela bem podia ter preferido crescer sem dividir com ele aqueles prazeres, só pra dizer que sabia mais, mas não, desde muito cedo ela o queria bem perto, dizia que a vida não tinha graça de espiar sozinha e por isso ia sempre lhe buscar pra trazer os olhos dele pra perto dos dela.

Ele respira fundo. Está a dois passos da porta da casa dela. Essas lembranças vieram no exato momento em que se aproximava pra lhe reencontrar, depois de anos distante daquele lugar. Sente a emoção molhar-lhe as vistas...os dois já não são mais os mesmos, como será vê-la assim, sem anúncio de chegada, sem tarde combinada, sem programa de quintal? Toma coragem e se anuncia, alguém escuta e abre a porta, ele entra e ela está sentada diante da janela. Ela o vê e, como se ontem tivesse sido a despedida, diz, com a mesma voz de criança que o acompanhou em todos os momentos em que se lembrou dela pra ter coragem de seguir caminho: “Sempre o mesmo, me fazendo esperar. Você quase me faz perder a hora da lua nascer...” Ele se aproxima e acompanha a direção do olhar que ela dirige pra fora da janela. A lua já ia saindo ali, bem perto, como da primeira vez em que a viram juntos. Ele entrelaça seus dedos nos dela e diz: “não vai me dizer que é de algodão doce!" “Claro que não”, ela responde, “dessa vez vou dizer que é de neve, só pra concordar com você”. A luz da lua se mistura com a alegria do lugar. Não dizem mais palavras... ali, entre eles, as lembranças e a certeza de que somente o silêncio poderia dar conta do amor de infância dos dois...
(da Série: "O amor de cada um", n.5)  

6 comentários:

  1. Oi, Ju!
    Vi a sua mensagem dois dias depois. Que pena...

    Seu texto hoje me pareceu um belo poema de seguir.
    um beijo

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  2. Que texto bacana, Ju. De quem é?
    É uma bela história de amor!!!
    Bj, Rita.

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  3. * Ritinha, você se esqueceu que de história de amor eu entendo? Não é só de música não! O texto é meu, que bom que você gostou.

    * Iêda, a vida é assim, não é mesmo? Encontros, descobertas, desencontros, reencontros com quem um dia marcou, de alguma forma, as nossas vidas e nos apresentou alguma forma de amar. Continuo aguardando o nosso encontro ao vivo e a cores, minha amiga. Um dia ele acaba acontecendo.

    Beijos pra você duas, que circulam entre as minhas letras! Ju.

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  4. Oi Ju.
    Acho que está chegando a hora desses textos ganharem o mundo. O blog ficou pequeno para tanta poesia.
    Bjs,
    Marta Denise

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  5. Ju, adorei o texto! É impossível dizer que tenha algum dia que não utilizemos alguma dose de um combustível precioso - e vital! - à nossa existência: as deliciosas lembranças de um ontem bem distante, mas nunca perdidos no passado ... tão pequeninos éramos, mas quão importante espaço ocupam em nossa alma! Te amo, mha linda prima e adorável amiga! Mauricio. PS: ... o trem de prata até hoje é dourado em meu core, não por ele em si, mas pq me levava pra onde sempre amei estar !!!

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  6. Baby,
    só continuo sem entender porque você demora tanto pra vir me ver em BH!!!!

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